O Diretor-Geral do Instituto de Tecnologia de Alimentos (Ital), Luis Madi, não tem dúvidas: não há inovação sem investimento em pesquisa. Entusiasta do trabalho integrado entre centros de pesquisa públicos e privados, Madi destaca o protagonismo dos ingredientes entre as tendências para o setor de alimentação saudável. Confira:
Fundação Cargill – Quando falamos de tecnologia de alimentos, estamos falando de que tipo de tecnologia?
Luis Madi – Estamos falando de toda a tecnologia utilizada para o processamento de alimentos, ou seja, de técnicas e métodos usados para tornar os alimentos consumíveis. Algumas são conhecidas do homem há muito tempo, como a pasteurização. Outras são mais recentes como o ultrassom, a radiofrequência, o micro-ondas, a separação por membranas, entre outras. Hoje, temos novos tipos de processamento adequados às características dos diferentes tipos de alimentos, mas o grande salto de inovação diz respeito aos ingredientes, que são utilizados atualmente para o enriquecimento dos alimentos, reforçando seus valores nutricionais.
FC – De que maneira este tema tem avançado nos últimos anos, sobretudo no Brasil?
LM – Nós temos uma das melhores legislações do mundo no que diz respeito à produção de alimentos, mas temos dificuldade na sua operacionalização. Não conseguimos, por exemplo, tratar a irradiação de alimentos como processo. A legislação brasileira prevê esse uso, mas ainda temos uma barreira cultural que dificulta o entendimento deste processo de conservação dos alimentos. Por exemplo, uma técnica segura, utilizada em todo o mundo e ótima para temperos, mas aqui não conseguimos colocar no mercado.
FC – Como a tecnologia pode contribuir para a segurança dos alimentos?
LM – Posso dizer que nunca tivemos tantas tecnologias e ingredientes para levar produtos, cada vez mais, seguros para o consumidor.
FC – Quais seriam as potencialidades das nossas entidades de pesquisa para impulsionar esses processos de inovação?
LM – Precisamos, primeiramente, de integração entre as universidades e os centros de pesquisa públicos e privados. Hoje temos uma situação diferenciada. Em 2010, a publicação Brasil Food Trends tinha um enfoque pontual. Agora, com o lançamento do Brasil Food Trends 2020 temos um foco ampliado para questões como saudabilidade, segurança dos alimentos, sensorialidade e sustentabilidade. Este documento passa a servir de orientação às faculdades para que elas busquem um trabalho de ponta alinhado a uma realidade que já acontece no país, impulsionando uma visão global do setor de alimentação.
FC – Como você avalia a formação atual dos nossos jovens universitários nas áreas de tecnologia dos alimentos?
LM – Ainda precisamos buscar conhecimentos sobre nanotecnologia e biotecnologia porque são duas áreas extremamente inovadoras. Creio que também é preciso haver uma complementação no processo de formação, principalmente nas áreas de embalagem e sustentabilidade.
FC – Que tipos de parceria o país tem neste campo?
LM – Hoje temos clareza de que os trabalhos têm que ser desenvolvidos em redes, de modo complementar. Com isso estou pensando novamente em integração entre universidades, iniciativas privadas e públicas. O mundo já mostrou que o caminho não é trabalhar isoladamente. O consumidor quer produtos saudáveis e saborosos. Precisamos buscar novas tecnologias de maneira conjunta e isto, no Brasil, ainda exige mudar uma posição cultural.
FC – Na sua avaliação, quais medidas são fundamentais para tornar o Brasil mais inovador?
LM – O Brasil possui um equívoco que fica visível se o compararmos com a União Europeia, além de países como Canadá e Austrália, que possuem grandes empresas assim como nós, mas também investem nas micro e pequenas empresas. Estas desenvolvem as inovações e conseguem alcançar os pequenos nichos que as grandes não conseguem. Então é preciso ter uma atuação complementar entre pequenas e grandes.
FC – Como você avalia o cenário industrial alimentício do Brasil hoje?
LM – Temos um grande potencial de desenvolvimento porque nós temos a produção do alimento em si. Não falo do alimento processado, pois ainda não somos tão inovadores como poderíamos ser.
FC – Quais os desafios para o desenvolvimento do setor alimentício no país?
LM – Precisamos de investimento em pesquisa e em assuntos regulatórios. Nenhum país vai desenvolver o setor de alimentos e bebidas se não se preocupar com essas áreas.
FC – Atualmente, o Ital está trabalhando em algum projeto especial?
LM – Estamos trabalhando em vários projetos, mas uma das nossas atenções tem sido o aproveitamento de resíduos na indústria de alimentos. Ou seja, como ter indústrias de alimentos sustentáveis, nas quais os resíduos não sejam jogados no meio ambiente.