Quando cuidar da alimentação coloca a saúde em risco

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Quando cuidar da alimentação coloca a saúde em risco

Nunca se falou tanto em alimentação saudável. A oferta de novos produtos, dietas, e a disseminação de blogs, perfis, celebridades digitais e aplicativos potencializaram a geração saúde. O que pouca gente imagina é que o que parecia inofensivo e saudável pode se tornar um problema: a ortorexia nervosa (ON).

Considerada por especialistas um comportamento obsessivo patológico, ela tem crescido consideravelmente nos últimos anos. Segundo o Dicionário Brasileiro de Nutrologia, a ortorexia é um termo utilizado para caracterizar a fixação por comer de forma saudável e que pode causar anemias, emagrecimento e prejudica, inclusive, as relações sociais e afetivas.

“As pessoas com este quadro apresentam uma preocupação excessiva com a qualidade da alimentação – limitando a variedade – e acabam excluindo certos grupos como carnes, laticínios, gorduras e carboidratos sem fazer a substituição adequada”, explica a Dra. Maria Del Rosario, médica nutróloga especializada em Distúrbios do Comportamento Alimentar e diretora da Associação Brasileira de Nutrologia (ABRAN).

Foi o que aconteceu com a jornalista Bianca Renó. Inicialmente, a dieta tinha como objetivo diminuir o nível de gordura corporal e balancear a alimentação. “Comecei a pesquisar e estudar sobre o assunto e então passei a fazer minha própria dieta, que funcionou muito bem no princípio e não era radical, mas sim ideal para meus objetivos na academia. Quando vi que estava conseguindo resultados, resolvi que me inscreveria para um campeonato de fisiculturismo, e passei a testar uma dieta chamada Paleo, que a princípio retira todos os alimentos industrializados e grãos da alimentação. Minha intenção era encontrar uma dieta com comida de verdade, mas que me desse as condições de participar do campeonato de forma competitiva”.

Bianca passou a usar todo o tempo livre para preparar marmitas e sempre que precisava almoçar fora de casa questionava todos os ingredientes e modos de preparo. Estabeleceu metas, passou a controlar o consumo de carboidratos por dia e viu sua vida mudar completamente. “Comer deixou de ser um prazer ou uma necessidade fisiológica para se transformar em um ritual de punição e autocrítica”.

Para a nutricionista Marle Alvarenga, pós doutora em Nutrição pela USP, coordenadora do Grupo Especializado em Nutrição, Transtornos Alimentares e Obesidade (Genta), é importante diferenciar um transtorno alimentar como a anorexia, que foca na magreza, da ortorexia onde o desejo é ser mais saudável. “Hoje em dia ser saudável é supervalorizado. As ideias e os mitos que se vendem na mídia, em blogs e perfis em redes sociais não têm nada a ver com saúde ou ciência. A alimentação saudável não deve envolver restrições”.

Distorção da autoimagem

As pessoas com ortorexia não têm medo de engordar, mas, sim, um quadro de distorção da autoimagem corporal. Sentem culpa e ansiedade quando cedem às tentações ou quebram as próprias regras. Quando não conseguem alimentar-se corretamente, realizam autopunições que podem variar entre jejuns, restrições alimentares ou excesso de exercícios físicos.

Daniela Queiroz, psicóloga ouvida pelo Alimentação em Foco, explica que os ortoréxicos geralmente são pessoas de caráter psicológico muito rígido, extremamente perfeccionistas, e em algum momento da sua vida passaram por algum constrangimento em relação ao seu corpo.

“Quem não tem uma relação distorcida com a comida não entende a penúria de alguém que desconta no prato, enchendo-o ou esvaziando-o completamente, suas decepções, ansiedades e derrotas”, fala Bianca. A jornalista já possuía um histórico de bulimia nervosa, que com os novos hábitos alimentares foi potencializado. “Ás vezes forçava o vômito depois de comer três abacates com cacau e adoçante seguidos – isso era permitido na dieta, mas eu sabia que estava comendo demais. A compulsão ficou incontrolável”.

São os familiares e amigos os primeiros a observar que o paciente está sendo muito rígido e inflexível com as escolhas alimentares. Há mudanças drásticas de humor, cansaço, queda de cabelo, unhas fracas, até chegar à perda de peso. “O problema é que a pessoa com ON não procura ajuda porque acredita que está fazendo a escolha certa. O ortoréxico acredita ter uma alimentação exemplar, tenta convencer quem está por perto e também critica os outros que não comem corretamente”, esclarece Maria del Rosario.

Para o tratamento, o ideal é que seja acionada uma equipe multidisciplinar especializada para avaliar, diagnosticar e tratar melhor todas as áreas (médicas, nutricionais, psicológicas, psiquiátricas), tendo em vista todos os sintomas.

Depois da conversa com familiares, Bianca procurou ajuda psiquiátrica. Além da medicação e da terapia, passou a praticar yoga e meditação. A jornada pelo autoconhecimento deu as ferramentas necessárias para que ela passasse a se aceitar. “Foi um processo lento, longo e muito solitário, que ainda não terminou, mas certamente hoje posso dizer que voltei a me alimentar normalmente, sem que cada mordida seja um tormento”.

“É muito importante entender que tais distúrbios alimentares se desenvolvem pelo simples fato de querer alcançar um corpo perfeito. Procurem saúde, nunca perfeição”, defende a nutricionista Louise Hamoy.

Sobre a descoberta, diagnóstico e pesquisas

O termo ortorexia nervosa foi criado em 1997, pelo médico americano Steven Bratman, autor do livro Health Food Junkies (Viciados em comida saudável). Embora tenham vários estudos sobre a ON, ela ainda não foi reconhecida como um transtorno alimentar distinto nos manuais de referência da Sociedade Americana de Psiquiatria, como da quinta edição do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, o DSM-5.

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